Uma fala protestante a respeito do movimento neopentecostal brasileiro
No próximo ano comemorar-se-ão os 500 anos da Reforma Protestante. Como protestante, é motivo de grande alegria e contentamento fazer memória desse evento que marcou, e ainda marca, a vida da Igreja.
Ao longo de sua história, o protestantismo passou por diversas mudanças. Desde a primeira divergência entre Lutero e Zwinglio a respeito da Eucaristia, passando pelos movimentos avivalistas e evangélicos e, mais tarde, o liberal, foram várias as alterações na maneira de pensar e fazer da teologia protestante. Com o passar do tempo, o protestantismo foi se abrindo a novas formatações e, com a chegada do movimento pentecostal no Brasil no início do século XX, fruto dos movimentos evangélicos que existiam desde o século XVII na Europa e desde o século XVIII nos Estados Unidos, passou a ser conhecido mais popularmente como movimento evangélico. Dessa forma, se dizer evangélico e protestante era entendido como sendo a mesma coisa, fato que permanece até dias atuais, embora isso seja questionável do ponto de vista histórico e teológico.
Infelizmente, hodiernamente, temos percebido um distanciamento crescente, por parte do movimento evangélico, das questões basilares do evangelho, principalmente com o chamado movimento neopentecostal. Esse movimento surge no Brasil no final da década de 70, tendo como ponto de origem o início da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Esse movimento neopentecostal é conhecido também como a 3ª onda do movimento pentecostal (BLEDSOE, 2012) e tem como características principais a batalha espiritual, os exorcismos, as curas imediatas e a prosperidade pessoal nesse mundo.
Essa busca frenética pela prosperidade é fruto da conhecida teologia da prosperidade que está presente nas igrejas de cunho neopentecostal. Em linhas gerais, essa teologia prega que se você está em comunhão com Deus e o serve fielmente, sendo fiel nos dízimos e ofertas, Ele tem obrigação de lhe abençoar e de fazer próspero financeiramente.
Por mais absurda que seja uma teologia assim, essas igrejas tem sido as que mais crescem no evangelicalismo brasileiro atual. Claramente, não pela sua teologia, mas pelo marketing e abuso da fé de pessoas menos esclarecidas teologicamente, sem se esquecer da sua organização centralizadora e com aspectos de corporação. Enfim, como uma empresa da fé. Dessa forma, por meio do grande investimento em comunicação e propaganda que se manifesta nos inúmeros programas de rádio e televisão, pessoas desesperadas se sentem atraídas a conhecer e frequentar essas denominações em busca de curas, milagres, alívio financeiro e espiritual.
O que se percebe é que muitos que frequentam essas igrejas são pessoas de coração sincero, que não fazem ideia das coisas que acontecem no nível gerencial da igreja. Essas pessoas foram convencidas de que Deus retribui o dizimista fiel e todo aquele que, como a viúva pobre “dá tudo o que tem”, sendo muitas vezes enganadas por diversos estelionatários que agem em nome da fé.
Para piorar, é esse o grupo que tem entrado nas esferas mais altas do poder brasileiro, propondo leis e incitando o ódio contra os menos favorecidos da sociedade, tais como índios, negros, homossexuais, mulheres e demais minorias do nosso país. Em busca de dinheiro e poder, transformaram templos em plataformas eleitorais e, uma vez tendo alcançado o poder, começaram a destruir a vida de vários daqueles e daquelas que os colocaram lá.
Diante de tamanha atrocidade feita aos mais pobres por parte dessas igrejas, é papel cristão se posicionar contra o uso da fé para a exploração, seja ela de que forma for e venha de onde vier. No espírito protestante, é necessário protestar veementemente contra isso.
Se cremos que por meio da ressurreição de Cristo a nova vida de Deus já irrompeu nesse mundo, as mazelas do mundo não podem se tornar para nós um mal necessário, mas precisamos nos indignar e lutar contra as diversas formas de exploração em nosso dia-a-dia. Porque vivemos Naquele que ressuscitou, na força do seu Espírito, não podemos aceitar que as forças geradoras de morte em nossa sociedade prevaleçam e tenham a última palavra, mas protestar contra tudo que gera a morte em nossa sociedade:
Dessa forma, ser protestante está também na origem do ser cristão.
Fabrício Veliq
Da série dos textos publicados no Portal Dom Total. Link: http://domtotal.com/noticia.php?notId=1036925