A teologia do diálogo inter-religioso deve ser vista como teologia política
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Fazer teologia com os pés fincados no social e no público, olhando a realidade na qual estamos inseridos não é algo simples, pois implica abordar determinada realidade a partir de certa matriz para, a partir daí, propor novas respostas. Dentre essas diversas realidades sobre as quais uma teologia política deve se debruçar, é possível perceber que a realidade do diálogo inter-religioso ainda precisa ser mais discutida.
Largamente trabalhada por teólogos e teólogas da América Latina, a teologia política se desenvolveu fortemente ao longo de mais de meio século desde os primeiros trabalhos que abordaram as realidades sociais, culturais e econômicas como base para propor teologias que viessem ao encontro do povo que as experimentavam.
As diversas experiências de teologias políticas que têm sido feitas ao redor do mundo revelam que o fazer teológico pelo viés político é um caminho que não tem mais como voltar atrás, por mais que movimentos fundamentalistas cresçam em diversos lugares do mundo tentando, novamente, estabelecer uma separação entre o sagrado e o profano. Essas teologias políticas, no entanto, resistem e continuam seu trabalho, olhando para o mundo e reconhecendo que é nele e a partir dele que toda teologia deve ser proposta e vivida. Por sua vez, essa mesma teologia incentiva e deseja ser feita pelos cristãos e cristãs presentes nas diversas classes sociais da sociedade para, a partir de suas realidades plurais, propor uma teologia que visa dar respostas às perguntas que são feitas por essa mesma sociedade. Nesse sentido, toda teologia política precisa também se tornar uma teologia da práxis. Essa forma de pensar e fazer teologia enriquece o conhecimento teológico e o desafia, visto o mundo estar em constante transformação, buscando respostas para as questões que afligem a contemporaneidade.
Dentre os vários desafios que a atualidade impõe à teologia, a questão do diálogo inter-religioso também se mostra importante. A teologia do diálogo inter-religioso também é, se comparado em termos históricos, algo recente, de maneira que a teologia cristã ainda está tateando formas de se falar das outras religiões de maneira dialogal. Nesse sentido, vencer o complexo de superioridade largamente difundido ao longo de séculos de história cristã se mostra como tarefa extremamente difícil, que demanda esforço e humildade teológica para se deixar aprender com outra religião que pensa diferente.
Diversas propostas de diálogo inter-religioso foram feitas até hoje. Essas diversas tentativas, ao mesmo tempo em que revelam um esforço de aproximação do cristianismo para com as outras religiões, também mostram o campo minado (para usarmos a expressão de Georges Khodr) que essa demanda possui.
Balancear identidade com diálogo não é uma tarefa fácil, bastando para isso observar as diversas querelas que se encontram dentro do próprio diálogo ecumênico, ou seja, dentro da mesma matriz cristã. Se entre nós, que possuímos a mesma fé já é complicado o diálogo, não é difícil afirmar que entre religiões que possuem fés diferentes a situação se mostra ainda mais delicada.
As propostas de diálogo inter-religioso pelo viés pneumatológico que tentam estabelecer critérios de discernimento para a ação do Espírito de Deus nas outras religiões, faz-nos inferir que pensar uma teologia do diálogo inter-religioso não se restringe somente ao campo da teologia sistemática e fundamental, mas traz também para seu bojo implicações éticas, políticas e sociais que devem ser consideradas, sendo, portanto, também campo para uma teologia política.
Com isso em mente, ousamos dizer que a teologia do diálogo inter-religioso deve ser vista também como uma teologia política, que visa pensar a sociedade tendo a categoria do diálogo inter-religioso como fundamento. Em outras palavras, o que afirmamos é que a teologia cristã do diálogo inter-religioso, caso queira ser uma teologia que faça diferença efetiva na realidade do mundo, não deve ser pensada como somente uma disciplina teórica e sistemática nos ambientes teológicos, mas deve estar atenta às implicações políticas, sociais e culturais que traz consigo, ou seja, ser vista também enquanto uma teologia política.