Conectados na rede e desconectados do mundo
Estamos numa era tecnológica. Embora haja ainda algumas pessoas que não se habituaram com isso, que nasceram antes da era da informática e dos computadores, é inegável que as telas ocupam grande parte da vida dessas pessoas também. Para os que nasceram após a década de 2000 no mundo ocidentalizado já se torna impensável um mundo sem telas, sem conexão com a internet, ou sem redes sociais. Para os mais novos, então, um mundo sem redes sociais poderia parecer extremamente sem graça e sem nada para fazer.
Curiosamente, é interessante se perceber que ao mesmo tempo em que se cresce a conectividade nas redes sociais e nos espaços virtuais, acontece também um distanciamento das relações pessoais e presenciais. Não é difícil encontramos grupos que dialogam diariamente em ambiente virtual, mas que demoram anos para se encontrarem presencialmente, face a face. Da mesma forma, não raramente se descobre que a pessoa super descolada, inteligente e mente aberta na internet, quando conhecida pessoalmente, revela-se como preconceituosa e rasa em suas argumentações.
O mundo online oferece essa opção. Pode-se ser o que quiser ser nas redes e pode-se passar a imagem que se quiser nos ambientes virtuais, mesmo que essas imagens não tenham nada a ver com a realidade do dia a dia. Afinal, a rede, principalmente as redes sociais são o lugar de pessoas felizes, sem problemas, sem stress, viajada, descolada, amiga de todas, dentre tantos outros adjetivos que se queira colocar. O importante é não deixar lugar para as tristezas, os desafetos e as intempéries do dia a dia, pois isso não cabe no ambiente em que todos veem. A alegria deve ser pública e o sofrimento deve ser privado, e, mesmo se compartilhado, deve ser somente para determinado grupo selecionado dessas mesmas redes. Em outras palavras, não há espaço para vidas imperfeitas nas redes sociais, devendo o mundo ser sempre colorido, ensolarado e com um sorriso no rosto.
Embora seja tentador esse mundo online, sair dele se torna importante. Afinal, o mundo real acontece longe das telas. É nele em que se dá o encontro verdadeiro com o ser do outro, com a dor da vida, com as intempéries e alegrias advindas da experiência cotidiana e dos relacionamentos diários. Abrigar-se somente num mundo online se esquecendo do mundo real não dificilmente se mostra como uma fuga que muitas pessoas buscam para não ter que lidar com o absurdo que, muitas vezes, a vida revela ser.
Do ponto de vista teológico, diante de um mundo virtual, em que cada vez mais pessoas se veem encantadas com ele e desejam nele habitar 24 horas por dia, acredito ser de mera importância resgatar o princípio da encarnação e seu conceito de assumir a carne do mundo. Em outras palavras, resgatar o valor do encontro com a pessoa do outro e não seu avatar, de maneira que possa haver espaço para as alegrias e tristezas que somente uma corporeidade que se relaciona com outra pode trazer.
Com isso, não se quer dizer que se deva abandonar as redes sociais ou que não se deve usufruir dos benefícios da conectividade. Falar isso seria um non sense. Contudo, trata-se de se estar atento ao grande perigo que há em se imaginar que é possível viver o ser cristão somente online, aparte da corporeidade. Somente ações efetivas, que tocam a realidade das pessoas, principalmente dos marginalizados da sociedade, que em sua maioria não estão nas redes, é que se é possível perceber a real compreensão do princípio da encarnação.
Assim, um suposto viver cristão que se manifesta somente nas redes e não age na efetividade do mundo não é um viver cristão autêntico, sendo, somente, um culto à própria vaidade.