Nossa pátria está nos céus: má compreensão que gera morte e apatia

Nossa pátria está nos céus: má compreensão que gera morte e apatia

Foto: Presidente toma café da manhã com a Bancada Evangélica do Congresso Nacional em 12 de maio de 2021 (Marcos Corrêa/PR)


Ainda hoje é muito comum se ouvir que uma pessoa cristã não deve entrar em assuntos da sociedade, nem tentar intervir neles porque a pátria celestial que se aguarda seria a verdadeira cidade na qual os salvos irão para sempre morar. Nesse sentido, permanece ainda na cabeça de muitas pessoas a ideia de que o que é importante é cultivar a vida espiritual e deixar que a sociedade tome o rumo perdido que possui por natureza, visto ter sido corrompida pelo pecado.

Uma vez que tal discurso permanece em muitas igrejas espalhadas pelo país, não é difícil perceber por que pastores, pastoras e líderes religiosos que usam o discurso da moralidade e santidade em suas campanhas políticas recebem tantos votos nesses nichos. Sem contar o famoso voto de cabresto existente em várias denominações, nas quais os fiéis votam no candidato ou candidata que o pastor manda votar, até mesmo nos lugares em que tais atos não acontecem, os discursos envoltos em uma aura de santidade ainda têm grande lugar no imaginário cristão.

Aqui surge um paradoxo: afinal, ao mesmo tempo em que se pensa que não se deve envolver com as coisas do mundo, também se acredita que determinado candidato ou candidata que fala usando o nome de Deus pode resolver os problemas de determinada sociedade.

Que isso causa um mal enorme para o país é notório. Basta ver o número de candidatos e candidatas que se elegeram no último pleito trazendo um discurso de moralidade e de que Deus estava ao seu lado e que, na verdade, tem contribuído grandemente para um retrocesso sem medida no país. A chamada bancada evangélica é um exemplo disso, com suas pautas discriminatórias, retrógradas e absurdas com bases em textos bíblicos tirados de seus contextos, fomentando os discursos de intolerância e segregação.

Da mesma forma, o candidato que se elegeu com o slogan “Deus acima de todos” tem se mostrado um dos mais ineptos e mais corruptos na história do país, envolvido juntamente com sua família em vários casos de corrupção, mostrando-se também como amante do negacionismo, da negligência, do descaso e da falcatrua, que se revelam de maneira escancarada com as diversas notícias que têm vindo à tona nos últimos meses com relação à compra das vacinas. Essas atitudes, por sua vez, já causaram a morte de mais de 530 mil pessoas no país, trazendo dor e sofrimento para mais outras tantas pessoas que perderam seus entes queridos num momento em que já havia vacina disponível para ser aplicada.

Esses exemplos servem para mostrar o quão pernicioso é separar a vida cristã da vida da sociedade. A compreensão do Evangelho nos mostra que o seguidor e a seguidora de Jesus deve ser uma agente de transformação, prezando para que a solidariedade, a inclusão, a fraternidade, a justiça social sejam efetivas na sociedade em que se encontra. Por causa de sua esperança no Reino de Deus que há de vir, e já experimentando, por meio da ressurreição, a nova criação de todas as coisas, deve lutar para que os valores desse Reino se façam presentes no hoje da história.

Enquanto aguardamos a plenitude do Reino, somos demandados por Deus a tomar partido contra a injustiça, contra aqueles e aquelas que usam seu poder para gerar discriminação e morte, contra todo discurso que, com aura de santidade, visa enganar o povo.

Diante disso, quando o texto bíblico fala que nossa pátria não é aqui, não faz um chamado para a apatia. Muito pelo contrário, nossa pátria não ser aqui quer dizer que o sistema mundano não é o que devemos seguir. Antes, que devemos seguir o exemplo de Jesus. Então, se Jesus lutou contra a injustiça em seu tempo, também devemos fazê-lo, se condenou os religiosos que enganavam o povo, também devemos fazê-lo, se foi contra um governo que trazia opressão ao povo, também devemos fazê-lo.

 

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