Vozes proféticas clamam no deserto: cuidado com o crescimento dos fundamentalismos no Brasil
Foto de . Fonte: Agência Senado.
Recentemente, vimos os ataques terroristas que aconteceram contra a democracia brasileira. Numa espécie de tentativa de repetir aquilo que aconteceu nos Estados Unidos, quando da derrota de Donald Trump, aqui se tentou um golpe de Estado, com o auxílio de diversos agentes públicos, seja protegendo tais atos e seus praticantes, seja fomentado tais ataques por meio de posts em redes sociais, fake News, mobilizações e até mesmo locação de veículos para levar terroristas para o local do crime.
Algo que chama a atenção (ou, pelo menos, deveria chamar) é o fato de que diversas dessas pessoas se afirmam cristãs e há, ao que tudo indica, uma grande parcela da população evangélica entre tais terroristas. Algo que pode ser notado ao se ouvir, em um dos diversos vídeos divulgados após a prisão dessas pessoas por parte da Polícia Federal, várias pessoas cantando hinos comumente cantados em igrejas evangélicas brasileiras, ou do movimento de Renovação Carismática, no caso do Catolicismo. Lembro de ter ouvido um hino bem conhecido, que em seu verso central diz: “porque ele vive, posso crer no amanhã”.
Esse fato, além de mostrar que hinos e textos bíblicos podem ser usados para se dizer e fomentar o que se quiser, bastando para isso retirá-los dos seus contextos e usá-los, também mostra o grande perigo que é ter líderes mal intencionados e que flertam com o fundamentalismo religioso.
Que o terrorismo e o fundamentalismo religioso andam de mãos dadas é algo inegável. Basta observar tais movimentos ao redor do mundo e se perceberá que fazer “a vontade de Deus” é um discurso comumente utilizado para matar pessoas que pensam diferentes, golpes de Estado, discriminação, tortura, terrorismos etc.
No Brasil, há tempos que diversas vozes proféticas têm se levantado em nosso meio, afirmando o perigo que corremos com o crescimento dos movimentos neopentecostais, aliados a uma teologia do domínio, de cunho neocalvinista, que deseja a todo custo transformar o Brasil em “uma nação cujo Deus é o Senhor”. Claramente, não no sentido bíblico, de uma nação onde reina a igualdade, a solidariedade, o amor, a justiça social etc, mas uma nação engessada, que pensa somente de uma maneira religiosa e que segue o literalismo bíblico conveniente para esse grupo, ancorados em uma teologia engessada, preocupada somente com os aspectos doutrinais e a letra dos documentos oficiais.
As vozes proféticas, por sua vez, bem como a teologia que anunciam, constantemente são chamadas de esquerdistas, desviadas, alarmistas, comunistas, petistas, dentre tantos outros termos por parte daqueles e daquelas que, disfarçados de cristãos, revelam-se como anticristos, visto irem contra os ensinamentos de Jesus.
Com isso em mente, faz-se urgente que a teologia seja pública. Ela não deveria estar restrita somente aos meios eclesiásticos. Urge a necessidade de um ensino religioso e teológico de qualidade em redes públicas de ensino, do fundamental ao superior, de maneira a evitar que movimentos fundamentalistas continuem se expandindo da forma como temos visto em nossa sociedade.
O perigo do fundamentalismo religioso existe e tem sido alertado constantemente por teólogos e teólogas ao redor do mundo. Seria sábio que o governo atual ouvisse tais vozes que gritam. No entanto, aparentemente, ninguém as ouve.
Condenar os terroristas, sim. Sem dúvida! Mas sem trabalhar os nascedouros de tais movimentos, corre-se o risco de que novos terroristas fundamentalistas religiosos surjam nas diversas igrejas espalhadas pelo país.