Jesus: um grande problema para o cristianismo
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A pessoa de Jesus sempre foi uma questão complicada para o cristianismo. Desde os primeiros séculos, os cristãos se viram desafiados a responder aos diversos questionamentos que surgiam a respeito dessa pessoa. Neste texto, gostaria de lembrar de duas questões: a questão de Ário, que motivou a resposta no Concílio de Niceia, de 325 e a questão da pesquisa a respeito do Jesus histórico e o Cristo da fé, que segue até dias atuais.
Ário, que era bipo da Igreja em Alexandria, acreditava que Jesus era a maior criatura de Deus, mas não era igual a Deus, o que, sem dúvidas, trazia grandes problemas para a soteriologia cristã, uma vez que, se Jesus não fosse Deus, de maneira nenhuma poderia salvar a humanidade, visto somente Deus ser poderoso para isso.
Da mesma forma, se Jesus não fosse Deus, então a humanidade não havia sido totalmente assumida pelo próprio Deus, impedindo assim a salvação humana, uma vez que somente aquilo que é assumido que pode ser salvo. Assim, a consequência da tese ariana é que a humanidade não estava salva em Jesus Cristo. Essa questão foi resolvida oficialmente no Concílio de Niceia, em 325, em que se estabelece a consubstancialidade de Jesus com Deus.
Outro exemplo é a questão da relação entre o Jesus histórico e o Cristo da fé que surge no século XVIII com Reimarus e se segue até os nossos dias. A questão gira em torno da tentativa de recuperar a verdadeira história de Jesus de Nazaré e nasce a partir do questionamento aos discursos oficiais da Igreja que, para alguns teólogos, não condiziam com aquilo que os Evangelhos falavam a respeito de Jesus.
Essas buscas a respeito do Jesus histórico, que se dividem, a rigor, em três fases, têm seus momentos bem definidos. A chamada primeira busca, ou Old Quest, compreende o período de 1748 a 1901 e tem como lema que o que é verdadeiro pode ser comprovado pelo viés histórico. Esse período termina com o trabalho de Albert Schweitzer que mostra que o Jesus histórico procurado pela Old Quest era impossível de ser encontrado.
A segunda fase, que se inicia em meados do século XX, tem seu enfoque em responder à proposta existencial trazida por Rudolf Bultmann. Para Bultmann, o que era importante não era o Jesus histórico, mas sim o Cristo da fé, ou seja, a mensagem que foi deixada pelos seus discípulos, o Kerigma.
Ernst Käsemann, aluno de Bultmann, foi o responsável por iniciar esse novo período de busca do Jesus histórico. Käsemann, ao mesmo tempo que aceitava o resultado da primeira busca de que seria impossível encontrar uma biografia de Jesus, também acreditava que o relato era condição para manter firme a experiência de fé dos primeiros discípulos.
Nesse sentido, e juntamente com outros teólogos, tais como Fuchs, Bornkamm, Colzemann e Ebeling, tinha em mente que o Jesus histórico é importante para o Cristo da fé, de maneira que não pode existir um sem o outro, já havendo no Jesus histórico uma cristologia implícita.
A terceira busca, que se estende até hoje, se concentrará em tentar retornar Jesus ao ambiente de seu tempo, à Galileia do primeiro século, na tentativa de refazer sua história a partir do contexto social, antropológico e cultura. Nomes como Geza Vermès, Gerd Theissen, John Meier, John Dominic Crossan e James Dunn são alguns dos pesquisadores que se debruçam sobre esse tema na atualidade.
Somente esses dois exemplos servem para mostrar o quão espinhoso é o estudo cristológico e como essa temática sempre foi ponto de dúvidas, questionamentos e tentativas de esclarecimentos dentro da sociedade em que se vivia.
Hoje, talvez, um dos grandes desafios para o cristianismo é a volta à Jesus e seu modo de vida com todas as implicações que isso tem para as grandes estruturas religiosas, que ao longo de toda a vida de Jesus, foram inquiridas e condenadas por diversas vezes serem instrumentos para afastar o povo do relacionamento amoroso com Deus.
Jesus, sem dúvida, continua sendo um grande problema para o cristianismo.