O amor como projeto
Photo by Kelly Sikkema on Unsplash
Ouvimos muito sobre o amor. Na verdade, em tempos atuais, vemos muita coisa sobre o amor. São filmes, figurinhas, animações, mensagens de vídeo, dentre tantas outras formas que circulam em nossas redes sociais que falam a respeito desse tema tão conhecido e ao mesmo tempo tão antigo na história. Na maioria das vezes, tais vídeos remetem à questão do carinho, do cuidado e da amizade, por já estar bastante presente que um amor verdadeiro abarca em si todas essas questões.
Contudo, ao observarmos as relações é também fácil de perceber o quanto a ideia de amor se tornou supérflua e, como fruto de nosso tempo, algo que pode ser meramente descartado como qualquer outra mercadoria. A lógica de uma economia neoliberal de que se deve buscar o lucro acima de tudo, otimizando o tempo para poder gerar mais riqueza para si também invadiu a dinâmica amorosa. É comum, até mesmo, utilizar palavras de cunho econômico para se falar a respeito de alguma relação. Frases do tipo: “acho que estou investindo pesado demais e não tenho nenhum retorno”, ou “esse relacionamento tem saído caro demais” são algumas das que se ouve no dia a dia e revela o quanto tal lógica econômica está entranhada em nossa maneira de falar sobre questões do nosso cotidiano.
Não que haja algo de errado em usar palavras e expressões de outros campos do conhecimento e aplicá-las às relações humanas. Isso, na verdade, faz parte da grande polissemia típica da linguagem e, quando bem compreendidas, tais expressões podem realmente dizer algo de significativo. O problema é quando se passa a viver as relações humanas (e, no caso, as de amor) como um grande mercado de ações, nas quais ficar ou sair equipara-se a mero comprar e vender para se obter maior lucratividade.
Quando isso acontece, perde-se de vista algo que, a meu ver, se mostra característico do amor, conforme compreendido dentro de uma proposta cristã, que é o projeto. Essa palavra, que deriva do latim projectus, quer dizer justamente “a ação de lançar para a frente, de se estender”. Daí que vem a palavra projétil, por exemplo. Se olharmos para o nosso cotidiano, projeto também possui o significado de plano, ou seja, “o desejo, intenção de fazer ou realizar (algo) no futuro”
Diante disso, é possível dizer que todo amor é um projeto. Como tal, traz em si tanto a própria definição de projeto que vemos acima, referente ao futuro, como também, a meu ver, revela em si o caráter construtivo que todo projeto precisa ter. O projeto, como algo desejado, revela-se também como algo inacabado, e por isso, deve sempre ser reconstruído e reprojetado, a fim de poder atingir seu termo. Dessa forma, pode-se dizer que todo amor, enquanto projeto, também traz em si a categoria do presente, sendo, portanto, necessário de ser vivido no presente da existência. Na verdade, nem poderia ser diferente, uma vez que esse é o único tempo que a humanidade, de fato, possui.
Como categoria de futuro, é possível compreender o projeto como sinal de esperança, uma vez que não se sabe se chegará a seu termo, mas se está disposto a colocar todas as energias e tudo que se tem para, na medida do possível, chegar à concretude daquilo que se projetou.
Compreendendo essas duas características, é possível perceber por que o amor não deve ser vivenciado dentro da lógica neoliberal da qual falamos mais acima. Da mesma forma, mostra a subversividade que o projeto de amar alguém traz em seu bojo, visto que o não descarte do outro segue na contramão da sociedade em que vivemos.
Isso não quer dizer que seja fácil e que basta somente boa vontade para tal. Para isso, basta perguntar às pessoas que são casadas há muitas décadas e se perceberá a unanimidade das respostas que afirmam a necessidade de adequação, concessão, conversas, atitudes etc. para manter o relacionamento por tanto tempo.
Em outras palavras, falam da necessidade de um projeto comum, tanto em seu caráter presente, no sentido de estar sempre disposto a rever o planejamento e adequá-lo à vida comum, quanto em seu caráter futuro, no sentido de ser uma esperança de que o caminho escolhido chegará a bom termo.
Não é de se admirar, portanto, porque Deus, a quem definimos como amor, pensou a criação como um projeto de relação.