Se o Pai é nosso, por que o cristianismo continua a excluir pessoas?

Se o Pai é nosso, por que o cristianismo continua a excluir pessoas?

Photo by Nathan Peterson on Unsplash


Pai nosso que estás nos céus.

 

Assim começa uma das orações mais conhecidas em todo meio cristão. Não importa se católicas, ortodoxas ou protestantes, todas as pessoas que pertencem ao cristianismo conhecem aquilo que ficou conhecido como a oração do Pai Nosso. Embora muito conhecida, infelizmente, é comum que tal oração tenha caído em certo recitar de palavras sem a reflexão necessária que tal ensinamento de Jesus nos coloca.

Algo que é importante de se ter em mente é que quando os discípulos pedem a Jesus que os ensine a orar, não estão fazendo algo muito diferente do que era feito em relação aos outros rabis nos tempos de Jesus. Era comum que os discípulos pedissem um resumo dos ensinamentos de seu mestre, a fim de serem memorizados e guardados em suas mentes (lembremos de que a escrita não era algo comum nesse período e a grande maioria da população não sabia ler e escrever). Dessa forma, quando os discípulos se aproximam de seu mestre e pedem que ele os ensine a orar, o que estão pedindo é de certa forma, um resumo daquilo que os ensinava.

Jesus, como sempre, coloca-se como um subversivo já na primeira parte de seu ensinamento. Tal oração começa com essa simples frase: Pai nosso que estás nos céus. Se nos lembrarmos de que Céus na Bíblia é comumente utilizado para se referir a Deus, dado o tabu judaico de não pronunciar o nome de Javé, temos nesse início de oração algo muito rico: Deus agora é tomado como pai. Dirigir-se a Deus como pai, por si só, já soaria bastante estranho dentro daquele ambiente judaico. Afinal, poderia ser considerado até blasfemo se colocar em uma relação tão íntima com Deus. Esse Deus, que é visto pelo povo judeu como Senhor, Criador dos céus e da terra, tão distante e tão diferente dos humanos deveria ser tratado com o máximo de temor, sendo inadmissível algum tipo de relação que denotasse uma proximidade tão grande entre o humano e o divino.

Mais subversivo ainda é o adjetivo utilizado por Jesus para falar a respeito desse Deus que é pai. Ele não é apresentado somente como o pai do povo de Israel, mas como um pai nosso, o que pressupõe a pluralidade de filhos e filhas. Ou seja, o pai de todas as pessoas, de maneira que qualquer diferenciação que pudesse ser requerida, ou qualquer tipo de privilégio que pudesse ser demandado por parte de alguma parcela do povo judeu se torna, agora, sem sentido, uma vez que todos e todas são filhos e filhas do mesmo pai, que é o próprio Deus.

Assim como Jesus chamava a Deus de pai, agora também ensina que, como pai, Deus não deve ser visto como alguém a quem somente alguns teriam o privilégio de se achegar a ele. Muito pelo contrário, Deus, como pai, pode ser acessado por todos os seus filhos e filhas. Muito subversivamente, Jesus ensina que esse pai não é mais exclusivo, mas inclusivo, que não segrega, mas tem o intuito de reunir todas as pessoas em seu reino.

Contrariamente a certa exclusividade tão demandada pelo povo de Israel, que aguardava um messias que restauraria o reino de Davi e instauraria uma espécie de Império judeu por meio da força e da violência, Jesus apresenta a inclusão como característica de um Deus que agora deve ser chamado de pai que ama e se mostra acessível e disponível a todas as nações.

Compreender o pequeno início dessa oração tão recitada deve ter o efeito de fazer com que o próprio cristianismo repense as diversas exclusões que ele tem praticado na atualidade por se achar no direito de exclusividade da relação com Deus, tais como a exclusão para com a comunidade LGBT, as mulheres e as outras religiões, dentre tantas outras que poderíamos citar.

Sem tal compreensão, essa oração não passará de palavras vazias que são repetidas diariamente por diversas pessoas que, sabendo o texto de cor, não são capazes de torná-lo efetivo em sua relações humanas.

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