O medo como fonte para a intolerância

O medo como fonte para a intolerância

Em outro texto neste portal, pensamos a verdade como fonte de intolerância. Neste, gostaria de pensar a respeito do medo como outra fonte desse mesmo problema que afeta milhões de pessoas ao redor do mundo e se mostra como questão teológica urgente para a contemporaneidade[1]. Esse medo, muitas vezes ancorado na questão da verdade se mostra como fator importante para se pensar a intolerância religiosa em nossos dias. Vários de nós, provavelmente, já ouviram a ideia de que o medo não é sempre negativo. O medo, muitas vezes nos protege, de maneira que podemos dizer que viver sem medo é algo temerário. A ausência do medo nos torna sem noção dos perigos sobre os quais estamos constantemente rodeados e pode, muitas vezes, nos levar à morte. Quem nunca passou uma experiência de medo e que depois percebeu que foi este que o preservou de fazer alguma bobagem, da qual se arrependeria depois? Assim, o medo é importante para a autopreservação humana e animal.
Tirando esta característica, porém, o medo apresenta outra face e é esta que nos interessa para falar a respeito da intolerância religiosa, uma vez que muito dessa intolerância surge devido ao medo que se tem diante daquilo que se é desconhecido. Tememos o que desconhecemos e isto, provavelmente, porque aquilo que desconhecemos não o dominamos e, se não dominamos, não sabemos o que pode sair dali e, não sabendo o que pode sair dali, é melhor não mexer com aquilo e considerá-lo como algo indevido e, em casos mais extremos, até mesmo errado, repulsivo e digno de morte.
Durante muito tempo, o cristianismo foi, de certa forma, ensinado a temer as coisas que eram contrárias aos seus dogmas, porque estas poderiam de alguma forma, afastar o fiel do caminho certo que ele deveria seguir. Isso o faria desagradar a Deus e, consequentemente, ter o fim de todos aqueles e aquelas que o desagradavam, ou seja, o inferno de fogo, no qual seria atormentado de dia e de noite por demônios ávidos por terror.
Que evitar este castigo seja um bom motivo para não desagradar a um Deus que pode te mandar para este lugar dependendo das coisas que você falasse, não parece ser algo que precisamos argumentar muito. Ainda hoje, esse tipo de visão permanece em nosso meio e, o servir a Deus segue mais pela linha do medo do que pela linha do amor e da liberdade.
De toda forma, esse tipo de postura de medo com relação ao diferente, infelizmente, ainda se faz muito presente no meio cristão. Tememos um monte de coisas, principalmente as coisas das religiões que desconhecemos e acreditamos que elas, em si, carregam algo de mal e de cruel que nos afastará de Deus e do seu amor, fazendo-nos, portanto, padecer em um lago de fogo pela eternidade. Quem pensa assim, claramente, não compreendeu nem a proposta cristã, nem o que é o inferno, nem o que vem a ser o amor de Deus, mas isto seria assunto para outro artigo.
O que cabe a nós perguntar aqui é como que esse medo motiva a intolerância religiosa e como seria possível combatê-lo, se é que, como cristãos, devemos fazê-lo. Seguindo na mesma cadeia lógica que expusemos a pouco, de que tememos o que desconhecemos e isto, provavelmente, porque aquilo que desconhecemos não o dominamos e, se não dominamos, não sabemos o que pode sair dali e, não sabendo o que pode sair dali, é melhor não mexer com aquilo e considerá-lo como algo indevido e, em casos mais extremos, até mesmo errado, repulsivo e digno de morte, a intolerância se mostra como o fim óbvio para os que seguem nesta trilha do medo. Daí se segue que um dos antídotos para o desconhecimento é o próprio conhecimento, o que deveria servir como incentivo para se conhecer mais sobre as diversas religiões existentes no mundo.
Curiosamente, dentro de uma proposta cristã, o verdadeiro amor é aquele que lança fora o medo, sendo, portanto, incompatível para um cristão, uma postura intolerante que nasça tendo o medo como seu fundamento.


[1]A partir desse ponto, reproduzo parte do artigo escrito por mim, intitulado Da intolerância ao diálogo: um caminho necessário. In: Revista Identidade!, v. 24, n.1, p. 126-136. Disponível em: http://periodicos.est.edu.br/index.php/identidade/article/view/3597/3163

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *