Teologia do Medo
Diante do cenário em que vivemos, são diversas as teologias que se dizem cristãs capazes de surgir sem que tenham o menor compromisso com as Escrituras, ou com as tradições que vieram antes delas. Uma dessas teologias é a que costumo chamar da teologia do medo. Essa, como o próprio nome deixa bem claro, tem o medo como seu lugar privilegiado de discussão e fundamentação, sendo, portanto, também o lugar para onde todas suas considerações convergem.
Pode parecer estranho pensar em uma teologia que tem o medo como base, contudo, se olharmos atentamente, os discursos trazidos por ela são conhecidos e até mesmo fomentados por diversos cristãos e cristãs dentro de suas igrejas. Quem nunca ouviu um/a pastor/a ou um padre dizendo a alguém, ou até a nós mesmos que se fizéssemos determinadas coisas o Inferno seria nosso destino, na expectativa de que esse alguém ou nós parássemos de fazer o que ele/ela considerava errado? Quem nunca viu alguém ou até mesmo se colocou como aquele/a que opta por uma pregação que afirmava que os outros irão experimentar a ira de Deus se determinada coisa for dita, ou ainda se algum comportamento não mudar? Mais ainda, quem nunca deixou de fazer alguma coisa porque pensava que Deus, que a tudo vê, estaria de olho e contabilizando o bem e o mal que se faz aqui na Terra?
Esses pequenos exemplos mostram que não é tão difícil sustentarmos uma teologia do medo. Não seria de espantar se em alguma pesquisa fosse constatado que a maioria cristã pensa em um Deus pronto para punir, mais do que um Deus pronto para amar e perdoar.
Claramente, uma teologia do medo tem grande poder e pode ser muito útil para líderes que querem manter os fieis sob sua tutela. O caminho é muito simples: uma vez que esse/a líder é visto/a como porta-voz de Deus, então é muito fácil convencer às pessoas de que tudo que ele/a diz deve ser considerado como sendo de origem divina. Ao se alcançar isso, basta adicionar que desobedecê-lo/a é a mesma coisa que desobedecer a Deus e se tem claramente como que o discurso dessa teologia do medo pode ser usado para levar pessoas a não pensarem nas estruturas de dominação disfarçadas de cristianismo que permeiam diversas igrejas pelo mundo.
A teologia do medo parte do princípio de que Deus deve ser temido. Por esse motivo, faz-se necessário que Ele seja visto como aquele que possui a balança da lei em sua mão e mede os atos com precisão milimétrica, tendo prazer na condenação dos infiéis, uma vez que, por ser santo, não pode ver a injustiça. Ainda que possa causar espanto e não ter nada a ver com a proposta da Jesus que chamava Deus de Pai, basta observar os discursos moralizantes e das “pessoas de bem” da atualidade para perceber como que essa imagem de Deus se mostra mais real do que nunca. Porém, é importante termos claro que quando a moralidade toma o lugar do amor, então já não é mais o Deus Pai que estamos seguindo.
O adágio “diga-me como é o seu Deus e eu te direi a pessoa que você é” se mostra, então, muito pertinente. Se virmos Deus como o juiz terrível que tem ânsia de condenar a todos e todas os/as devassos/as, prostitutos/as, desocupados/as, não cristãos etc para instaurar a comunidade das “pessoas de bem” e santas na Terra, então a teologia do medo é uma boa candidata para ancorar nossa pregação, nossas relações e nossas obras no mundo.
Se, contudo, virmos Deus como o Pai de Jesus Cristo, que ama a todos e todas, que faz chover sobre maus e bons, que se coloca ao lado dos pobres, marginalizados/as, prostitutas e miseráveis, concedendo a eles primazia no Reino que há de vir, então não é difícil de perceber que no lugar de uma teologia do medo entrará em cena uma teologia do amor.