Um Cristianismo exclusivo
No mundo atual, a busca por aquilo que é exclusivo parece ser uma constante na sociedade e são várias as pessoas que buscam ser consideradas dessa forma pelos outros. Assim, não é suficiente ter uma conta bancária, antes, deve-se ser o/a cliente que tem o cartão exclusivo do banco para ser considerada especial. Do mesmo modo, é inútil fazer uma viagem que todos já fizeram. O mais importante é fazer essa viagem com um plus, exclusivo para assinantes etc. Em outras palavras, pode-se dizer que ser exclusivo/a é visto como sinal de status e de superioridade por muitos no mundo contemporâneo.
De maneira paralela, podemos pensar que também o Cristianismo entrou várias vezes nessa dinâmica. Ao longo de sua história, foram diversos os momentos nos quais o pensamento exclusivista estava na ordem do dia no movimento cristão. Se atentamos para isso, não é difícil entender porque, já nos primeiros séculos de história cristã, o discurso de que somente os convertidos ao Cristianismo seriam salvos e todos os pagãos e judeus que não o fizessem estariam condenados por não quererem fazer parte do grande plano divino era tão difundido entre os cristãos
Com a conversão de Constantino e o estabelecimento de um “Império Cristão” (por mais estranho que isso seja), o Cristianismo se tornou a religião oficial e seu discurso exclusivista de único meio pelo qual se obtém a salvação também se tornou pouco questionável no Ocidente da Idade Média. Mesmo com a secularização ocorrida na Idade Moderna, fruto do movimento Iluminista, que tirou da Igreja cristã grande parte do seu poder sobre o Estado (pelo menos, em tese), a visão exclusivista não deixou o movimento cristão, sendo percebido de maneira muito clara nos diversos movimentos protestantes nos quais ocorrem as chamadas campanhas de evangelização para salvação do mundo por meio do evangelho. “Salvar o mundo”, para a maioria desses movimentos, quer dizer a conversão de todos ao Cristianismo, o que por si só, já nos chama a atenção para o caráter de superioridade e exclusividade que esse tipo de discurso traz.
Ainda que no campo teológico seja possível perceber um grande avanço na questão do diálogo inter-religioso, na vivência e mentalidade diária de vários cristãos e cristãs, ainda permanece certa visão exclusivista de que pertencer ao Cristianismo é estar na religião superior, mais perfeita e mais sublime do que todas as outras. Assim, tentar converter a todos e todas para o Cristianismo, a fim de que os “perdidos” encontrem a salvação é visto como dever por muitos.
Curiosamente, os Evangelhos mostram, diversas vezes, um Jesus que não se preocupa com exclusivismos, sendo o caso de certo homem que expulsava demônios e não andava com os discípulos relatado tanto em Marcos 9:38 quanto em Lucas 9:49 o mais emblemático para se pensar isso. O texto deixa claro que Jesus é contra a ideia de que é preciso ser do seu grupo de discípulos para estar a favor da sua causa. Isso nos chama a atenção para o fato de que o Evangelho não entra numa dinâmica que busca o exclusivismo. Muito pelo contrário, Jesus pregou um Evangelho que inclui os excluídos da sociedade no Reino de Deus.
Compreender isso se mostra, então, tanto como o primeiro passo, como também como um grande desafio para um Cristianismo que se propõe a dialogar com as religiões e as situações do tempo atual. Ao mesmo tempo, também propõe um questionamento sobre a disposição desse Cristianismo atual de abrir mão de sua posição exclusivista, chamando-o a reconhecer que a Boa Nova que será pregada depende muito da resposta que se dá a essa pergunta hoje.
Que resposta daremos a esse questionamento?