Onde há amor, ali Deus está
A questão da sexualidade sempre foi um problema ao longo da história cristã. Desde Agostinho, com sua moral sexual extremamente rígida, as ideias de que sexo é um “mal necessário” para cumprir a vontade divina de procriação, ou um prazer que deve seguir diversas normas bem determinadas para ser aceito por Deus, ainda permeiam a mentalidade de muitos cristãos, mesmo que essas doutrinas nunca tenham sido a posição oficial do Catolicismo ou do movimento da Reforma.
A primeira, em tempos atuais, é considerada por muitos como um absurdo. Os que o fazem, realmente, estão certos. Afinal, considerar o sexo somente para reprodução traz consigo, além da objetificação da mulher ao considerá-la o “campo fértil” onde a semente deve germinar, ainda traz consigo a ideia de que todo prazer sexual é, em si mesmo, algo errado, o que acarreta diversos problemas psicológicos para os que são submetidos/as a isso.
A segunda, porém, manifesta-se de uma forma ambígua. Quando se trata da relação entre homem e mulher, há um consenso de que o que acontece entre quatro paredes fica entre quatro paredes, sendo o casal que se relaciona o único responsável por definir aquilo que se faz na relação sexual deles. Assim, não existe uma lista de pode e não pode, mas o prazer de ambos deve ser buscado com base no amor, na liberdade de cada um em escolher o que quer que seja feito, e no consentimento mútuo entre as partes envolvidas. Dessa forma, o prazer sexual não é visto como algo errado, mas como expressão do sentimento de amor que existe entre um homem e uma mulher e, ao fazerem isso, ambos glorificam a Deus nessa união de amor.
Porém, quando se trata de uma relação homoafetiva, seja masculina, seja feminina, todos esses preceitos caem por terra e as normas bem determinadas das quais falamos acima se tornam divinas. Com esse pano de fundo, desconsidera-se totalmente se há na relação desses casais o amor, o respeito, a liberdade e o mútuo consentimento. Sob a égide do “Deus disse” (tomando textos totalmente fora dos contextos em que foram escritos, para usarem como pretexto para justificar seus preconceitos) todas as relações homoafetivas são colocadas no mesmo bojo e categorizadas como “repugnantes” e algo que “Deus condena”. Ou seja, o único relacionamento aprovado por Deus seria aquele composto por um homem e uma mulher.
O que esse discurso afirma é que somente entre casais heteroafetivos há amor, respeito, liberdade e consenso, o que a própria realidade mostra que não é verdade, bastando para isso acompanhar os diversos relatos de estupros dentro do casamento, violência doméstica baseada em ciúmes, perseguição a mulheres que rompem relacionamentos, dentre tantos outros que aparecem nos noticiários todos os dias.
Em qualquer relacionamento em que essas coisas acontecem, podemos dizer que não há amor verdadeiro como entendido pelo Cristianismo. Ou, afirmaremos cruelmente que algum relacionamento abusivo é algo desejado por Deus?