Discursos extremistas ou amor extremo?
É visível no mundo em que vivemos o crescimento dos movimentos extremistas. No Brasil, desde todo o processo que culminou com o impeachment de Dilma, esse crescente se mostra de uma maneira bastante assustadora. A ideia de que há o lado dos certos e o lado dos errados, o dos que amam o país e o dos que o odeiam e o lado dos bons e dos maus tem gerado uma grande polarização no meio da sociedade. Nessa polarização, e como consequência dela, é possível identificar os diversos radicais que surgem desses meios.
O clamor de ambos é o mesmo: é preciso mudar a sociedade, uma vez que ela, do jeito que está, caminha para um buraco aterrorizador, tendo ainda um grupo que a quer jogar nesse buraco para poder dominar sobre ele. Assim, a luta de todo movimento extremista tem sempre um alvo muito claramente definido, categorizado como aquele grupo que pensa totalmente diferente e tem visões de sociedade e governos divergentes.
Nesse sentido, há um caráter messiânico que perpassa toda a dinâmica desses grupos de cunho extremista, uma vez que esses se veem como responsáveis em livrar a todos aqueles que ainda não viram que estão mergulhados em uma sociedade que os oprime, ao mesmo tempo em que se veem como o exército valente que tem a função de destruir as forças do mal.
Diante desse cenário, uma teologia comprometida com a sociedade e que deseja ser uma voz que faça sentido no meio em que está inserida tem um grande desafio. Uma vez que toda teologia deve ser contextualizada e falar a partir da comunidade da qual surge e dado o cenário brasileiro atual que se comentou acima, é imprescindível que ela se levante não como mais uma voz extremista dentre as várias que se ouve, mas como voz profética que denuncia o erro nos diversos lados do discurso.
Para isso, uma teologia que é fruto de um olhar atento e engajado na sociedade é imprescindível. No que tange a uma teologia cristã, isso tem a ver totalmente com a compreensão dos eventos da Encarnação e da Ressurreição. Encarnação, no sentido de assumir a carne da sociedade, assimilar o sofrimento dos mais pobres, sofrendo com eles, reconhecendo nos marginalizados da sociedade a presença do Crucificado. Uma teologia que tem seu modo de se fazer através disso substitui o discurso extremista pelo discurso que nasce de um amor extremo pelos renegados da atualidade. Ressurreição no sentido de compreender que, uma vez mortos com Cristo, também se ressuscita com Ele e, assim, “as coisas velhas se passaram e eis que se fizeram novas” (2Co 5:17). Esse dado da ressurreição que traz consigo a esperança de que haverá novos céus e nova terra vindos da parte de Deus, deve nos fazer perceber que a sociedade atual não é aquela desejada pelo Criador, e assim promover em nós o engajamento na luta por uma sociedade mais justa e equânime.
Somente uma teologia que concilie esses dois conceitos cristãos com práticas condizentes a eles será capaz de ser uma voz contra os extremismos vigentes. Nesse sentido, a tarefa de uma teologia cristã para hoje tem muito mais a ver com uma vivência atual e significativa dos princípios da Encarnação e Ressurreição do que com um discurso de meras condenações e aprovações que tanto se assemelham aos diversos discursos extremistas da atualidade. Agindo assim, a voz da teologia pode alcançar lugares em que os meros discursos não alcançam, uma vez que, como diria Hans Urs von Balthasar, “somente o amor é digno de fé”.