Proselitismo como disfarce de diálogo inter-religioso
No mundo atual, é comum se ouvir falar a respeito do diálogo inter-religioso e de sua necessidade. Caso seja feita uma enquete perguntando a respeito dessa temática, é bem provável que todos responderão que é uma tarefa urgente e que precisa estar em um mundo que acolha o diferente e trabalhe em prol da boa convivência com todos os povos da Terra.
Porém, ao se observar os eventos atuais e os diversos conflitos que marcam as matérias dos jornais e diversos sites na internet, é possível perceber que muitos desses conflitos são de cunho religiosos, o que contrapõe, em muito, o discurso tão comumente falado por todos.
Diante disso, pensar o lapso que se tem entre o discurso a respeito do diálogo inter-religioso e a sua efetivação se mostra como tarefa necessária. Para começar, a definição do quem vem a ser um diálogo se mostra importante. O diálogo acontece quando duas pessoas, organizações, ou religiões, estão dispostas a ouvir uma a outra com atenção e apreço, na tentativa de um mútuo entendimento e crescimento a respeito de determinado assunto. Nesse sentido, claramente, o que está em jogo não é quem está com a verdade, mesmo que a discussão seja a respeito daquilo que é verdadeiro, antes, em como cada um pode cooperar entre si para, mediante o diálogo honesto, chegar a soluções para problemas comuns, como também clarear os pontos naquilo em que se continuará diferente.
Um dos lapsos muito comum ao se falar sobre o tema do diálogo inter-religioso é pensar em um discurso proselitista. Nesse tipo de discurso, muitas vezes fantasiado de abertura ao que é diferente e, diversas vezes, nomeado como “diálogo inter-religioso”, está implícita a ideia de que todo aquele que não pertence à determinada religião precisa ser convertido a uma outra, geralmente àquela a qual pertence o que propõe o suposto diálogo entre essas religiões.
Nesse discurso proselitista, ouvir ao que pertence a uma outra religião não tem a ver com real abertura e real interesse no que ele tem a dizer sobre sua maneira de ver o mundo e sua relação para com Deus, antes ouvir o outro tem somente a intenção de encontrar os erros doutrinais para, mediante argumentos vindos de sua própria religião, tentar convencer ao que falou primeiro de que este está em um caminho errado e precisa, então, se voltar para o caminho da luz.
Dessa forma, rompe totalmente com o pilar daquilo que se considera como base para o diálogo inter-religioso, ou seja, o crescimento e entendimento mútuo. Afinal, se aquele que segue para um diálogo já parte do princípio de que tudo que será falado pelo outro deve ser “depurado” e deve ser “esclarecido” para que esse alcance a “verdade” da qual aquele é detentor, então esse “diálogo” não passa de mera encenação a fim de mostrar certa abertura e satisfazer as expectativas do mundo atual.
O diálogo, e principalmente o de cunho inter-religioso, necessita que ambas as religiões estejam abertas para ouvir e se edificarem com a fala daqueles que não pertencem a elas. Sem isso, se continuará, constantemente, dentro de uma lógica proselitista que visa somente conversões a religiões sem a preocupação da convivência respeitosa entre si. E pelo que se tem visto, é justamente esse tipo de discurso que, juntamente com a questão econômica, gera as guerras e atentados em nosso mundo atualmente.
Ao longo da história do cristianismo, diversos foram os discursos proselitistas e, ainda hoje, é possível vê-los em diversas comunidades, principalmente de cunho evangélico.
O medo do diferente, porém, não deve paralisar os esforços daqueles que buscam um verdadeiro diálogo entre as diversas religiões, sejam as do nosso país, sejam as grandes religiões universais.
Tão importante quanto se voltar para o diálogo inter-religioso, é estar atento para se identificar aquilo que é proselitismo nos convites ao diálogo. De alguma forma, o primeiro só acontece quando o segundo é superado.