Diálogo: um imperativo para nosso tempo
Vinde e arrazoemos, diz o Senhor (Isaías 1:18a)
Na sociedade que vivemos atualmente é grande a carência de diálogo, mesmo que todos falam que estão dispostos a dialogar. Qualquer um que perguntar ao seu vizinho se esse é uma pessoa de diálogo, em 90% dos caos a resposta será positiva e esse falará que é uma pessoa totalmente a favor da conversa, etc. É comum vermos isso também na nossa vida diária: pais que dizem que devem dialogar com os filhos, mas, no lugar disso, batem neles, pessoas que falam que precisamos respeitar às outras religiões, mas, no lugar disso zombam e escarnecem das que não são iguais à sua, e a lista segue de forma crescente. Em todos esses casos é grande a discrepância entre fala e prática.
Zygmunt Bauman, grande sociólogo polonês, é conhecido por muitos pelo seu livro Sociedade Líquida, bem como por diversas entrevistas que faz em diversos canais de televisão. Em uma entrevista dada ao canal Aljazeera, em certo momento nos chama a atenção para essa facilidade que temos, dado à nossa vida online, de excluir e simplesmente ignorar as posições que são contrárias àquelas que temos. Um simples click e não ouvimos mais aquilo que aquele que pensa diferente de nós.
Claramente, esse tipo de atitude do mundo online entra em nossa relação com o mundo off-line. Vivemos sobre a constante ameaça de silenciar as vozes que nos são contrárias e a conviver e ouvir somente ás vozes que nos são favoráveis e, pelo que podemos perceber em nossa sociedade atual, isso cresce a cada dia. Basta ir em alguma manifestação de rua em que milhares estão apoiando determinada causa. Se chega alguém com uma posição diferente esse ou essa é visto ou vista como inimigo ou inimiga da manifestação. Cada dia mais estamos nos fechando em nós mesmos e excluindo aqueles que pensam diferente de nós.
Porém, contrariamente a essa ideia, o texto do profeta Isaías nos mostra um Deus que nos convida ao diálogo. Algo que é interessante de se notar é a transformação que acontece por meio dessa arguição: ainda que os pecados sejam vermelhos como escarlate, eles se tornaram brancos como a lã”. Embora a maioria das vezes esse texto seja usado somente para falar a respeito do pecado e do perdão divino, também penso que esse texto deve ser lido na perspectiva da transformação que todo diálogo honesto traz àqueles e àquelas que se dispõe a fazê-lo. O diálogo serve para nos transformar em alguém melhor do que éramos antes de entrarmos nele. Sua motivação não deve ser, portanto, fazer um prosélito, mas sim, aprender com o outro aquilo que ele tem a ensinar. Isso sim seria um diálogo honesto.
Porém, para que se possa haver o diálogo honesto, é necessário que, tanto ambos se mostrem conhecedores da posição que defendem, como também que se abram de todo pré-julgamento do “outro” lado. Se se vai para um diálogo “armado”, então já está indicado que ali não haverá diálogo. Para diálogo é necessário o desarmamento, é necessária a disposição do ouvir e a disposição para, uma vez convencido, mudar de opinião.
Nesse sentido, como defendem Lapide e Moltmann, um diálogo é sempre uma posição de humildade frente ao outro. Reconhecer que nosso discurso e nossas “verdades” são somente uma visão imperfeita a respeito do mundo que nos cerca é um dos primeiros passos para que possamos estar dispostos a ouvir o outro com o coração aberto.
Sem humildade e um coração aberto para ouvir o outro não há diálogo que dure.
Diante disso, diante da situação atual que temos vivido em nosso país, onde diversos políticos estão tentando minar o direito dos mais pobres com um discurso que se mostra cada vez mais falso, a necessidade do diálogo se coloca como imperativo.
Não podemos mais ter a atitude de “bloqueio” em relação às opiniões diferentes das nossas. Precisamos ouví-las, precisamos discutí-las e também assimilá-las para que mudanças substanciais em nossa sociedade possam ser vislumbradas.
Enquanto ficarmos nas acusações e pré-julgamentos a respeito dos que são de “direita” e de “esquerda”, sem a disposição para um diálogo honesto entre ambos os lados, continuaremos a colher misérias e governos que atacam a população e se enriquecem às custas de brigas entre aqueles que deveriam estar junto para o bem de todos.