Salvadores: um risco para nós
Um fenômeno interessante e ao mesmo tempo preocupante tem acontecido ao redor do mundo. Falo a respeito da volta de um discurso nacionalista e xenofóbico que vemos ganhar força em países como França, na figura de Marine Le Pen, nos Estados Unidos, com a eleição de Donald Trump, e na Inglaterra, com a questão do Brexit. Os discursos, até onde tenho notícia, giram em torno de uma suposta ameaça terrorista, de que imigrantes estão tomando o emprego dos que são do país, e de que é necessário reavivar os valores da sociedade Ocidental contra certa islamização do mundo. Um ou outro está presente quando ouvimos os discursos dos defensores dessa modalidade de governo. Alia-se a isso uma instabilidade econômica e taxa de desemprego, você tem um cenário propício para o surgimento dos discursos de salvação da nação e de uma “volta” dos anos de ouro da nação.
No Brasil, no momento atual que vivenciamos, em que a corrupção está em seu nível astronômico, totalmente descarada e sem escrúpulos, o discurso de se reavivar a boa conduta e a ordem no país também se mostra como um prato cheio para aqueles que se consideram salvadores e salvadoras da nação.
Geralmente, para esses salvadores e salvadoras, a culpa sempre está naquilo que é de fora. Na maioria dos discursos, os salvadores e salvadoras se colocam como aqueles e aquelas que são exemplos para todos e que, devido a isso, são os que tem a capacidade moral e o pulso firme para lutar contra aquilo que aflige a sociedade, a fim de libertá-la da bárbarie e da situação insustentável que determinada nação se encontra.
Os judeus no tempo de Jesus também esperavam esse tipo de salvador. Àquela época, os judeus estavam sobre o domínio do Império Romano e a promessa de que o Messias viria e libertaria o povo da escravidão estava latente em suas expectativas.
Porém, ao olharmos a narrativa dos evangelhos, percebemos que Deus revela sua salvação não por meio de alguém que era um exemplo de moral para a sociedade, antes, por meio de alguém que era considerado, aos olhos dos legisladores do seu tempo, um blasfemo. Se atentarmos à narrativa cristã, veremos que Deus, na pessoa de Jesus, a fim de propor uma solução para o mundo, não se coloca de fora, como alguém que não tem nada a ver com a situação e não é culpado de nada, muito pelo contrário, como nos diz Paulo, Ele se fez pecado por nós para que por meio dele pudéssemos ser feitos justiça de Deus. Assim, a salvação proposta por Deus não se mostra como alguma coisa meramente externa, como algo que vem de fora, antes, como totalmente encarnada e em seu total compromisso com o mundo.
A situação de desespero e de falta de escrúpulos que vemos na política de nosso país e a corrupção endêmica que carregamos conosco enquanto brasileiros e brasileiras, cujos saques feitos por cidadãos civis do Espírito Santo somente nos revela o nosso estado enquanto cidadãos e cidadãs, nos fazem inclinados a buscar salvadores e salvadoras que trazem os discursos que queremos ouvir e as soluções prontas para nos tirar do desespero e desesperança em que muitos de nós se encontram.
Diante disso, faz-se importante estarmos atento aos discursos de falsos salvadores que ouvimos por aí. Infelizmente, são diversos os cristãos e cristãs de nosso tempo que se deixam levar por discursos que são excludentes, xenofóbicos e discriminatórios, fantasiados de “vontade de Deus” para a humanidade. Discursos esses que, confrontados com a mensagem que se mostra na cruz, não se mantém de pé.
Que nossos olhos e ouvidos estejam atentos para que não sejamos enganados por discursos que pregam a paz por meio da guerra e a vida por meio da morte.